
Constituição Federal
“Art. 5º (…)
IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; (…)
IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (…)
Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. (…)
Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.”
Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica) – Decreto 678/1992
“ARTIGO 13 Liberdade de Pensamento e de Expressão
Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.”
Repercussão geral
Tema 995 do STF – “1. Na hipótese de publicação de entrevista, por quaisquer meios, em que o entrevistado imputa falsamente prática de crime a terceiro, a empresa jornalística somente poderá ser responsabilizada civilmente se comprovada sua má-fé caracterizada: (i) pelo dolo demonstrado em razão do conhecimento prévio da falsidade da declaração, ou (ii) culpa grave decorrente da evidente negligência na apuração da veracidade do fato e na sua divulgação ao público sem resposta do terceiro ofendido ou, ao menos, de busca do contraditório pelo veículo; 2. Na hipótese de entrevistas realizadas e transmitidas ao vivo, fica excluída a responsabilidade do veículo por ato exclusivamente de terceiro quando este falsamente imputa a outrem a prática de um crime, devendo ser assegurado pelo veículo o exercício do direito de resposta em iguais condições, espaço e destaque, sob pena de responsabilidade nos termos dos incisos V e X do artigo 5º da Constituição Federal; 3. Constatada a falsidade referida nos itens acima, deve haver remoção, de ofício ou por notificação da vítima, quando a imputação permanecer disponível em plataformas digitais, sob pena de responsabilidade.”
Destaques
- TJDFT
Conflitos entre direitos fundamentais – liberdade de expressão e ofensa aos direitos da personalidade – violação à intimidade e à vida privada – indenização por danos morais
“3. A liberdade de expressão e o direito à informação, embora fundamentais, não possuem caráter absoluto, devendo respeitar os direitos da personalidade, como a honra, a imagem e a vida privada, em conformidade com o princípio da dignidade da pessoa humana. 4. A conduta da requerida foi imprudente ao insistir na obtenção de declarações, desrespeitando a negativa inicial dos autores, que se encontravam em situação de vulnerabilidade emocional e social, violando seus direitos de intimidade e vida privada. 5. O ato ilícito restou configurado pela publicação da entrevista sem o consentimento devido, com repercussão significativa na esfera íntima dos autores, diante dos inúmeros comentários vexatórios, gerando danos morais.”
Acórdão 1981083, 0749760-96.2023.8.07.0001, Relator(a): RENATO SCUSSEL, 2ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 26/03/2025, publicado no DJe: 24/04/2025.
Liberdade de expressão – publicações em redes sociais e distribuição de panfletos – ausência de excesso ou abuso
“3. O exercício da liberdade de expressão, garantido pelo art. 5º, IV, da Constituição Federal, deve ser harmonizado com os direitos à honra e à imagem das pessoas, protegidos pelo art. 5º, X, do mesmo dispositivo, cabendo responsabilização civil quando houver abuso ou excesso no seu exercício. 4. A divulgação de informações sobre o inadimplemento contratual dos apelantes, realizada por meio de redes sociais e panfletagem em espaços públicos, teve o intuito de alertar potenciais consumidores sobre a conduta dos autores, não se constatando excesso ou abuso que justificasse a condenação por danos morais. 5. A menção à inadimplência dos apelantes não foi isolada ou infundada, sendo corroborada por registros em plataformas de reclamação de consumidores e relatos de terceiros que alegam terem sido lesados pela mesma empresa, afastando a alegação de calúnia ou difamação. 6. Ofensas verbais proferidas em conversas privadas entre as partes não configuram dano moral passível de indenização, por não terem sido amplamente divulgadas ou gerado repercussão pública.”
Acórdão 1987130, 0707032-13.2023.8.07.0010, Relator(a): SONÍRIA ROCHA CAMPOS D’ASSUNÇÃO, 6ª TURMA CÍVEL, data de julgamento: 02/04/2025, publicado no DJe: 22/04/2025.
Imunidade parlamentar – suposta ofensa vinculada em aplicativo de mensagem (whatsapp) – liberdade de pleno exercício do mandato legislativo
“3. Mesmo que a opinião do deputado tenha sido lançada em grupo de aplicativo de mensagens, não se pode retirar o caráter de debate social que seu conteúdo detém, sobretudo por se tratar de grupo do Whatsapp composto por agentes de segurança desconhecidos do réu, que não compunham seu círculo íntimo de amizade, tratando-se de opinião manifestada dentro de sua atuação como parlamentar, em assunto de relevância social, que está constantemente sendo debatido nas Assembleias e Câmaras Legislativas do país. 3.1. As mensagens enviadas no referido grupo de Whatspp, composto pelas mais diversas pessoas, não tinham a pretensão de ficar restritas ao grupo, que denota o caráter informativo e a finalidade de discussão social de temas levantados pelo deputado réu naquele ambiente. 4. A manifestação do deputado réu, apesar de aparentemente ser contrária aos direitos já conquistados pela comunidade LGBTQI+ (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais, travestis, queer, intersexuais e outros), não pode ser reprimida, pois sua atuação como deputado lhe garante imunidade para debater as questões em voga e até trazer à discussão novos temas por mais espinhosos e controversos que sejam, sem que lhe sejam impostas sanções cíveis ou penais, nos termos do art. 53 da CF. 5. No caso, não houve excesso nos limites da garantia constitucional de inviolabilidade do deputado, não tendo o réu abusado da imunidade concedida ao exercício de seu mandato, pois foi comedido em suas palavras, não ofendendo diretamente a honra das pessoas envolvidas na foto que deu início ao debate público em que o réu se manifestou. 6. A democracia e o Estado Democrático de Direito devem preservar a livre manifestação de ideias, fazendo-o por meio de seus representantes eleitos, a quem a Constituição da república garantiu o direito de se expressar incondicionalmente, no exercício de seus mandatos, não limitando sua atuação à tribuna de suas casas legislativas, mas estendendo sua imunidade a todos os ambientes em que o parlamentar puder falar, no exercício de sua legislatura, inclusive nas redes sociais (precedentes).”
Acórdão 1935260, 0704452-71.2022.8.07.0001, Relator(a): ROBSON BARBOSA DE AZEVEDO, 2ª TURMA CRIMINAL, data de julgamento: 24/10/2024, publicado no DJe: 08/11/2024.
Direito à liberdade de expressão – críticas às postagens publicadas em rede social sobre decisão da Corte Colombiana relativo ao aborto – agentes políticos
“A liberdade de expressão representa um dos pilares que amparam o Estado Democrático de Direito e deve ser assegurada a todos de forma indistinta. O Marco Civil da Internet reforça a importância desse direito fundamental, ao estabelecer que a disciplina do uso da internet no Brasil tem como princípio, entre outros, a garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da Constituição Federal. O direito à liberdade de expressão não visa proteger apenas opiniões supostamente verdadeiras, admiráveis ou convencionais, mas, acima de tudo, a divergência de opiniões, os juízos de valor e as críticas a agentes públicos, por certo que, quando há unidade de pensamento, não há necessidade de tutela do direito; o direito tem relevo, justamente, para assegurar as divergências de opinião, quando manifestadas de maneira exagerada, satírica, humorística ou não compartilhada pela maioria. Considerando que as partes são agentes políticos e que o tema abordado na publicação é sensível e polêmico, compete-lhes lidar com a divergência de opinião como consequência natural da manifestação do pensamento e como forma de enriquecimento do debate, e não como afronta aos direitos de personalidade.”
Acórdão 1640757, 07067945520228070001, Relator: ESDRAS NEVES, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 23/11/2022, publicado no DJE: 2/12/2022.
Liberdade de expressão – exposição de cartazes feitos por alunos em escola pública – desenho com o símbolo da cruz suástica na farda da polícia militar – inocorrência de ofensa à honra – atividade educativa
“1. Apelação versa sobre a possibilidade de configuração de danos morais em decorrência da exposição, em mural de instituição pública de ensino fundamental, de cartazes com imagens de policiais militares em prática de atos de violência contra negros, constando em uma dessas imagens a inserção da cruz suástica na farda da polícia militar. 2. In casu, não há que se falar em danos morais, pois a imagem reputada ofensiva pela apelante foi exposta dentro de contexto pedagógico e informativo, ou seja, em uma instituição de ensino durante ato comemorativo do Dia da Consciência Negra, o que afasta a intenção de imputação de conduta caluniosa, difamante ou injuriosa. Dessa forma, não há ato ilícito quando se pratica o fato com ânimo diverso. Na hipótese, extrai-se, em verdade, o animus narrandi do desenho com o símbolo da cruz suástica, de modo que não houve abuso, mas mero exercício regular das liberdades de expressão de pensamento, de atividade artística e de crítica. 3. Logo, in casu deve prevalecer a livre manifestação do pensamento dos discentes, não restando caracterizado ato ilícito em decorrência do uso do símbolo da cruz suástica no contexto da atividade educacional em comemoração ao Dia da Consciência Negra por ausência de comprovação da intenção de imputação de conduta caluniosa, difamante ou injuriosa aos policiais militares ou à instituição policial em seu conjunto.”
Acórdão 1654995, 07096714820218070018, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 5ª Turma Cível, data de julgamento: 1/2/2023, publicado no DJE: 10/2/2023.
Crime de desacato – xingamentos contra policiais no exercício da função – inexistência de violação à Convenção Americana sobre os Direitos Humanos – tipicidade da conduta
“IV. O Pacto de San José da Costa Rica, que entrou em vigor no Brasil em 25/09/92, com a promulgação do Decreto 678/1995, se tornou um dos pilares da proteção dos direitos humanos, tendo em vista que consagra direitos políticos e civis, além daqueles relacionados à integridade pessoal e à proteção judicial. Com efeito, diante de divergência de entendimento entre as Turmas do STJ quanto à descriminalização da conduta prevista no art. 331 do CPB, decidiu o colegiado pela afetação do HC 379.269/MS, de modo a pacificar a questão. Nesse passo, ao cotejarem a convencionalidade entre a Legislação Penal Brasileira e o Pacto de San José, firmaram o entendimento de que a manutenção do crime de desacato no ordenamento jurídico não implica descumprimento do art. 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos, que trata da liberdade de expressão (STJ. 3ª Seção. HC 379.269/MS, Rel. para acórdão Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 24/05/2017). Ademais, como frisou o i.Relator a tipificação do desacato como crime é uma proteção adicional ao agente público contra possíveis ofensas sem limites, e não prejudica a liberdade de expressão, já que não impede a manifestação do cidadão, desde que o faça com civilidade. No espécie, restou demonstrada conduta contrária às regras de urbanidade e civilidade, configurando o crime de desacato. V. A materialidade delitiva se encontra estampada no Termo Circunstanciado, corroborada pela prova oral produzida em juízo, levando a conclusão de que o apelante teria xingado os policiais, que estavam no exercício de sua função pública. As descrições das circunstâncias da abordagem não demonstram qualquer ilegalidade na conduta dos policias, restando devidamente demonstrado o dolo do réu/apelante de desacatar os policiais na tentativa de se furtar à revista policial.”
Acórdão 1657347, 07508731120218070016, Relator: FLÁVIO FERNANDO ALMEIDA DA FONSECA, Primeira Turma Recursal, data de julgamento: 27/1/2023, publicado no PJe: 9/2/2023.
Liberdade de expressão – ofensa à imagem e à honra objetiva de pessoa jurídica – avaliação negativa de serviços advocatícios em plataforma da internet – vedação ao anonimato
“A Constituição Federal em seu art. 220´consagra a ampla liberdade de expressão: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.” Também há proteção explícita aos direitos da personalidade, entre os quais o direito à honra, imagem, privacidade e proteção de dados pessoais (CF, art. 5°, inciso X). 2. No plano abstrato, tais direitos se colocam em tensão – iminente conflito. Como não há direitos absolutos, deve-se considerar as circunstâncias do caso e, com recurso à ideia de proporcionalidade, verificar qual direito deve prevalecer. (…). 4. Em face de colisão ou tensão entre o direito à honra – ou outro direito da personalidade – e a liberdade de expressão, deve-se, a priori, prestigiar a ampla possibilidade de manifestação. É possível, porém, em situações especiais, a prevalência dos direitos individuais, previstos no art. 5º da Constituição Federal, especialmente nos casos de evidente abuso da liberdade de expressão. 5. A Lei 12.965/2014 (Lei do Marco Civil da Internet-MCI) também apresenta limites aos que exploraram comercialmente a Internet.(…). Em análise do comentário questionado, mediante ponderação entre o direito à liberdade de expressão do usuário e o direito à honra da apelante, está caracterizado o abuso do direito de manifestação e de opinião. 8. Constatados indícios de prática de ilícitos civil (ofensa à honra da apelante – art. 12 do Código Civil), e penal (crime de difamação contra pessoa jurídica – art. 139 do Código Penal), estão cumpridos os requisitos para determinar a quebra do sigilo de dados cadastrais para identificação do usuário, nos termos do art. 22 do MCI.”
Acórdão 1637976, 07128423020228070001, Relator: LEONARDO ROSCOE BESSA, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 9/11/2022, publicado no PJe: 24/11/2022.
- STJ
Veiculação indevida de imagem em programa televisivo – ausência de autorização – abuso do direito de informação – indenização por danos morais
“5. A liberdade de expressão não é absoluta e deve respeitar os direitos da personalidade, incluindo a honra e a imagem, sendo considerada abusiva quando ultrapassa os limites da ética e da boa-fé. 6. A veiculação de informações inverídicas sobre o agravado, sem sua autorização, caracteriza ato ilícito e gera responsabilidade civil por danos morais. 7. A imagem do agravado, embora pública, foi utilizada de forma descontextualizada e sem autorização, reforçando a antijuridicidade da conduta da emissora.”
AgInt no REsp n. 1.899.356/MG, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 14/4/2025, DJEN de 24/4/2025.
- STF
Crime de desacato – conformidade com a Convenção Americana de Direitos Humanos – recepção pela Constituição de 1988
“1. Trata-se de arguição de descumprimento de preceito fundamental em que se questiona a conformidade com a Convenção Americana de Direitos Humanos, bem como a recepção pela Constituição de 1988, do art. 331 do Código Penal, que tipifica o crime de desacato. 2. De acordo com a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e do Supremo Tribunal Federal, a liberdade de expressão não é um direito absoluto e, em casos de grave abuso, faz-se legítima a utilização do direito penal para a proteção de outros interesses e direitos relevantes. 3. A diversidade de regime jurídico – inclusive penal – existente entre agentes públicos e particulares é uma via de mão dupla: as consequências previstas para as condutas típicas são diversas não somente quando os agentes públicos são autores dos delitos, mas, de igual modo, quando deles são vítimas. 4. A criminalização do desacato não configura tratamento privilegiado ao agente estatal, mas proteção da função pública por ele exercida. 5. Dado que os agentes públicos em geral estão mais expostos ao escrutínio e à crítica dos cidadãos, deles se exige maior tolerância à reprovação e à insatisfação, limitando-se o crime de desacato a casos graves e evidentes de menosprezo à função pública. 6. Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada improcedente. Fixação da seguinte tese: “Foi recepcionada pela Constituição de 1988 a norma do art. 331 do Código Penal, que tipifica o crime de desacato”.
ADPF 496/DF, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 22-06-2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-235 DIVULG 23-09-2020 PUBLIC 24-09-2020.
Doutrina
“A Constituição Federal de 1988 insculpiu em seus artigos 5º, incisos IV, IX e XIV e artigo 220 os princípios da Liberdade de Expressão e Manifestação do Pensamento e da Liberdade de Informação (ou de Imprensa). Fê-lo, contudo, como também em relação a todos os outros direitos e garantias fundamentais, sem criar direito absoluto ou ilimitado.
Assim, trouxe, a par da garantia desses direitos e liberdades, as hipóteses de seu temperamento ante os eventuais danos causados às pessoas ou as exigências relativas às suas vidas privadas, honras e imagens.
(…)
Infere-se muito claramente do texto constitucional que a liberdade de expressão e manifestação do pensamento e a liberdade de informação jornalística em que pese de enorme amplitude encontram único anteparo a partir do exato mesmo dispositivo constitucional que as introduz na vedação do anonimato e na inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, assegurados o direito de resposta proporcional ao agravo e a indenização pelos danos materiais ou morais decorrentes de sua violação (incisos IV, V e X).
Assim, tem-se que, além da proteção positiva enquanto direitos autônomos (inciso X do art. 5º da CF), a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem estão também protegidos de forma negativa em virtude da norma insculpida no parágrafo primeiro do art. 220 da CF (…).
(…)
José Cretella Júnior nos lembra que a liberdade de pensamento, em si mesma, nunca foi um problema para o direito, pois o ser humano pode pensar o que quiser e ninguém será punido pelo seu pensar (nemo poenam cogitationis patitur). Segundo o autor, o pensamento, bom ou mau, que pode interessar às religiões e à moral – que exaltam o primeiro e condenam o segundo – é estranho às cogitações do mundo jurídico. É o pensamento transitivado, ou seja, manifestado, que sai da mente do homem e chega aos demais, que interessa ao direito e é essa manifestação do pensamento, este ato de exteriorizá-lo o objeto da proteção constitucional, como liberdade pública fundamental. Em seguida, Cretella Jr. cita um trecho de rara clareza e bem ao estilo elegante de Carlos Maximiliano (Comentários à Constituição Brasileira de 1891, ed. de 1918, p. 710): ‘o pensamento é íntimo, simples função psíquica, incoercível. Dele faz uso até o encarcerado. O próprio indivíduo dificilmente o evita; cada um sente a tortura de uma ideia, que desejaria expungir do cérebro. Reivindica-se apenas a liberdade da palavra, que é a expressão do pensamento’.
Sobre a importância do direito à informação e à liberdade de comunicação, ensina Gustavo Bonato Fruet que na qualidade de um princípio fundamental, conforme ensina René Ariel Dotti, a liberdade de comunicação é ‘a faculdade da pessoa de desenvolver as atividades relacionadas com o ato ou efeito de emitir, transmitir e receber mensagens por meio de métodos ou processos convencionados’. Para o autor, entre as garantias fundamentais para a efetividade de tais direitos destacam-se as relativas à divulgação e à crítica, pois estas seriam garantias inerentes e impreteríveis ao exercício da atividade, v. g., dos meios de comunicação. Ele afirma que, em verdade, tais fenômenos devem ser também encarados como deveres impostos pelo Estado de Direito à imprensa, ao rádio, à televisão e aos demais meios de comunicação: ‘trata-se de uma valiosa contribuição para tornar factíveis os princípios de legalidade, moralidade, impessoalidade e publicidade dos atos administrativos, estabelecidos pelo artigo 37 da Constituição. Aliás, a censura pública (libertas convinciandi) é um dos traços marcantes da informação independente. Em determinadas circunstâncias, a imprensa livre não exerce apenas um direito, como também cumpre um dever imposto pela convivência democrática. De nada valeriam as garantias formalmente instituídas na Constituição e na lei se não houvesse mecanismos e hábitos compatíveis com a implementação de um regime que, efetivamente, garanta aos profissionais e colaboradores dos meios de comunicação, ao público destinatário e à sociedade em geral, as condições para que a informação seja praticada com liberdade e responsabilidade’.
Desdobrando o conceito da liberdade de pensamento consagrada na Constituição Federal de 1988, leciona Pinto Ferreira que o sistema democrático e jurídico-constitucional da liberdade de pensamento é básico e desdobra-se das seguintes maneiras: a) liberdade de consciência, compreendendo a liberdade de crença (direito de professar qualquer religião ou de ser ateu) e a liberdade de opinião (ou o direito de possuir convicções próprias em matéria política ou filosófica); b) liberdade de exteriorização do pensamento, abrangendo a liberdade de culto (organização de movimentos religiosos, proselitismo, edificação de igreja e templo) e, além disso, a liberdade da palavra, imprensa, cátedra, ou aprendizagem científica, artística, literária.
Colhe-se do magistério de Paulo Gustavo Gonet Branco, ao tratar do conteúdo da liberdade de expressão, que a garantia da liberdade de expressão tutela, ao menos enquanto não houver colisão com outros direitos fundamentais e com outros valores constitucionalmente estabelecidos ‘toda opinião, convicção, comentário, avaliação ou julgamento sobre qualquer assunto ou sobre qualquer pessoa, envolvendo tema de interesse público, ou não, de importância e de valor, ou não’.
Até porque, ‘diferenciar entre opiniões valiosas ou sem valor é uma contradição num Estado baseado na concepção de uma democracia livre e pluralista’.
Sobre os modos de expressão ‘é intuitivo associar uma controvérsia suscitada pelo uso da palavra num discurso ao tema da liberdade de expressão. Não é grande tampouco a dificuldade de enxergar nesse domínio uma representação figurativa da realidade ou a projeção material de um estado anímico, quando, por exemplo, um artista pinta um quadro, compõe uma música ou fotografa um tema que lhe pareceu importante fixar’.
Essas são formas muito comuns – e as mais lembradas – mas estão longe de ser os únicos meios de manifestar pensamentos, sentimentos e juízos de valor. Os seres humanos podem fazê-lo até em silêncio, através do gesto ou de seu comportamento e um falso dilema se instaura sobre a abrangência da garantia à liberdade de expressão. Nos parece claro que as formas não influem na garantia, pois o que está garantido é o ato de manifestar, ou seja, extrair o pensamento, o sentimento (a produção do espírito, enfim) e manifestá-lo exteriorizando-o. Sobre o tema, recentemente, o Supremo Tribunal Federal, por exemplo, entendeu que sair em passeatas como a ‘marcha da maconha’, que tinha como intenção defender a revisão da legislação e a descriminalização do uso dessa planta, configura regular exercício da liberdade de expressão e não o delito de apologia do cometimento de crimes. Vê-se que o exercício da liberdade de expressão dá-se de formas múltiplas e vai muito além do discurso e da palavra.”
BENTIVEGNA, Carlos Frederico B. Liberdade de expressão, honra, imagem e privacidade: os limites entre o lícito e o ilícito. Barueri: Manole, 2019. E-book. p.87. ISBN 9788520463321. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9788520463321/. Acesso em: 28 abr. 2025.
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