As desculpas de quem faltou ao trabalho foram as mais variadas, como por estarem sofrendo de efeitos do calor e da luz, dor na coluna e gastroenterite
Considerado uma paixão nacional, o Carnaval move multidões. Por vezes, até quem não deveria estar no meio da folia, dá um jeito: foi o que constatou o detetive particular Frank Telles, que foi contratado por quatro empresas de Minas Gerais para flagrar empregados que, embora tenham apresentado atestado por supostos motivos de saúde, viajaram para curtir a festividade no Espírito Santo.
As desculpas de quem faltou ao trabalho para curtir o Carnaval foram as mais variadas, como por estarem sofrendo de efeitos do calor e da luz, calor e insolação, dor na coluna e gastroenterite.
As quatro empresas mineiras, dos ramos de petshop e de geopesquisa e sondagem, têm o hábito de procurar o serviço do investigador anualmente, por já suspeitar da fraude.
“Alguns já deixam consultas agendadas para a data antecedente ao feriado. Neste ano, os flagrantes foram feitos nos bloquinhos de rua de Guarapari, na praia de Marataízes e de Piúma”, disse Telles.
De acordo com o investigador, a falsificação de um atestado médico configura ato de improbidade, além de infração contratual de natureza grave, prevista no art. 482, “a”, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), sendo motivo para a dispensa por justa causa do empregado.
Análise jurídica: quais as consequências de apresentar um atestado falso?
Para entender a situação sob a perspectiva jurídica, a reportagem do Folha Vitória conversou com a advogada trabalhista e previdenciarista Luiza Baleeiro. Segundo a jurista, a penalidade máxima que pode ser aplicada ao empregado é a justa causa.
“Antes da aplicação dela, a empresa pode se valer de advertência e até mesmo suspensão, uma vez que cada caso é considerado individualmente. Achando o empregador que a gravidade da situação enseja a ruptura do vínculo trabalhista, poderá dar justa causa, especialmente pela quebra da confiança, já que houve uma mentira ou apresentação de documento como atestado médico falso”, esclareceu.
Além de uma demissão, pelos dias não trabalhados, pode haver desconto no salário. Fora estas punições, a CLT apenas autoriza nas hipóteses de haver previsão contratual.
“Os danos morais em face de empresa são quanto à lesão à honra objetiva da empresa. A sua ocorrência deve demandar prejuízo à imagem. Em casos como este, de falta do empregado para prática de outros atos, compreendo não ser cabível”, acrescentou a especialista.
Interferência em futuras contratações
Apesar de um ato como a entrega de um atestado com a finalidade de curtir o carnaval ser um ato imoral, Baleeiro explica que nenhuma anotação desabonadora das condutas do empregado deve ser registrada na carteira, ainda que o empregador esteja correto. “Isso é vedado pela CLT, inclusive em relação ao registo da justa causa”, disse.
“A punição de quem praticou o ato deverá ser a justa causa, suspensão ou advertência, sendo entendimento prevalente que em casos como este a falta é grave ao ponto de ser direto aplicada a justa causa. A anotação poderia ser vista como mais uma penalidade pela mesma conduta, o que não deve acontecer. Além disso, a anotação pode gerar direito a indenização por danos morais em favor do empregado”, explicou.
Na mesma linha da carteira de trabalho, não é possível expor a conduta do empregado, como, por exemplo, com uso de fotos dele na folia.
“A situação também poderá inclusive gerar danos morais ao empregado. Neste sentido, é importante lembrar que as pessoas contam com direito de imagem, que também deve ser respeitado”, pontuou.
Responsabilidade criminal
Para a advogada, o empregado pode responder criminalmente. No caso do atestado para aproveitar o Carnaval, a responsabilidade penal estaria relacionada ao contexto gerado pela falta, não pela ausência ao trabalho em si.
“Algumas perguntas servem como norte: o empregado falsificou um documento médico original? Ele usou um atestado falso? A depender do ato praticado, possui enquadramento penal típico”, disse.
Outros casos investigados durante o Carnaval
Além dos casos envolvendo trabalhadores, o detetive Frank Telles contou que também é bastante comum ser contratado para investigar casos conjugais durante o Carnaval.
“Acontece muito de haver confusão entre namorados. A justificativa principal do que quer curtir é de realizar viagens fictícias para casa de parentes, com o objetivo de visitá-los. Mas na verdade isso tudo é para cair na folia mesmo”, contou.